MORTE INDUZIDA
Em Porto Alegre (RS), prefeitura quer matar animais com suspeita de leishmaniose
07 de maio de 2017 às 12:30
Um texto publicado pela deputada federal Regina Becker Fortunati (Rede) nas redes sociais, centralizou o debate em torno de uma decisão da Secretaria Municipal da Saúde (SMS) de Porto Alegre. No Diário Oficial, a Secretaria publicou uma “dispensa de licitação”, anunciando a contratação de uma clínica veterinária para “serviços de morte induzida de até 300 caninos soropositivos para leishmaniose visceral canina”.
O texto de Regina questiona o exame realizado nos animais para atestar que seriam portadores da doença. Segundo ela, o Elisa, realizado pelo laboratório gaúcho Lacen, pode dar resultados “falso-positivo” e “falso-negativo”, já que detecta qualquer carga parasitária no sangue. Assim, mesmo em um cão que estivesse com um tipo comum de carrapatos, que não apresentaria risco de morte, o exame poderia dar positivo para a leishmaniose. O único laboratório do país que trabalha com exame específico para detecção da doença seria a Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro.
“Além dos ativistas e defensores dos animais, os gaúchos e brasileiros não aceitam o assassinato de vidas sob motivo torpe, abominando que se resolvam questões que envolvem a saúde pública de outra forma, que não combatendo o transmissor de doenças, neste caso, o mosquito-palha”, escreveu a parlamentar, conhecida por seu trabalho em prol da causa dos direitos dos animais.
A Secretaria Municipal de Saúde afirma, no entanto, que a história não é bem assim. Após o registro das mortes de duas pessoas por leishmaniose, na região do Morro Santana, a Vigilância em Saúde teria começado ações de conscientização na região e alertado os moradores sobre o perigo de transmissão pelos cães. A assessoria da pasta afirma que pediu liberação para realização de 300 procedimentos para evitar uma nova contratação mais a frente. De acordo com ela, na realidade, Porto Alegre tem hoje 15 cães sendo mantidos no canil da antiga Secretaria de Defesa dos Animais (Seda), que foram diagnosticados com a doença. Outros 50 animais aguardam resultados de exames, mantidos no mesmo local. Todo processo estaria sendo acompanhada por profissionais da Seda, Ministério da Saúde e Vigilância.
Dos 15 cães, a SMS diz que a maioria vivia em casas com famílias. Eles não sabem estimar quantos eram cães abandonados. Segundo o órgão, os animais foram entregues pelos próprios tutores “após solicitação dos agentes da Vigilância em Saúde”.
Neste ponto, o relato da deputada Regina Becker também difere do da SMS. Segundo a parlamentar, seu gabinete estaria recebendo diversos relatos de pessoas preocupadas com a intenção da Prefeitura de “morte induzida” animais com suspeita de leishmaniose. Em entrevista por telefone, ao Sul21, a deputada afirma que os animais viriam da comunidade da Vila Lajeado, na região do Chapéu do Sol, zona Sul de Porto Alegre. “Nós temos depoimentos de pessoas de animais que foram retirados dos pátios das casas, sem autorização das famílias, pela Vigilância Sanitária. Isso é uma arbitrariedade. Em nome da saúde pública, fazer isso?”, questiona ela.
Regina diz ter “certeza que o prefeito Nelson Marchezan Jr. não tomou conhecimento sobre o caso”, porque ele estaria trabalhando como “aliado” da causa. A assessoria do prefeito não retornou ao contato da reportagem sobre o assunto. A deputada, que ajudou a criar a Seda durante a gestão do ex-prefeito José Fortunati (PDT), afirma que tanto ela quanto o marido sempre foram “avessos à ideia de exterminar animais sem ter certeza que estivessem doentes” e que a ação de agora teria a ver com questão histórica”.
Porém, segundo ela, essa visão sempre enfrentou resistência entre um grupo de servidores. “Quando criamos a Seda, tomamos conta de uma área que era deles na Lomba do Pinheiro, porque queríamos reverter a filosofia do local, que antes era sinônimo de morte de cães. Mais de 200 cães eram mortos por mês lá, porque não tinha política públicas para atender”, lembra ela.
A deputada afirma ainda que está em contato com diversas ONGs de defesa dos animais, que já estariam mobilizando advogados para intervir na ação da Prefeitura. O Ministério Público Estadual também estaria entrando com ação para anular a contratação da empresa.
A Secretaria de Saúde diz que enviou carta-convite a seis empresas para que apresentassem orçamento, o que levou a dispensar a abertura de licitação, conforme publicado no Diário Oficial. A empresa contratada foi a que apresentou menor preço. Em nota, a Secretaria informa: “O valor do procedimento que inclui – morte induzida com anestesia e destinação final de acordo com a Resolução da Diretoria Colegiada da ANVISA 306/204 – varia conforme o peso dos animais, podendo ficar entre R$ 105,00 (até 5kg) e R$ 505,00 (acima de 50 kg)”.
A equipe da Secretaria afirma ainda que Porto Alegre não registrava casos de leishmaniose há 10 anos e garante que “está seguindo protocolo do Ministério da Saúde. Eles dizem não ter data para quando os procedimentos seriam aplicados.
Enquanto isso, Regina Becker apela ao prefeito para que a administração repense a condução da questão. “Enquanto trabalhamos num esforço conjunto para a abertura da Unidade de Saúde Animal Victória, buscando recursos privados para viabilizar atendimento aos animais de pessoas de baixa renda, outro esforço conjunto trabalha em sentido contrário, usando recursos públicos para matar animais com ‘suspeita’ de uma doença, em nome da saúde pública. Nosso apelo, prefeito Marchezan. A vida é o bem maior!”.
Fonte: Sul21
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